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São Paulo: Recorde de inadimplência de precatórios

Geraldo Alckmin
Por Marco Antonio Innocenti no Estadão
O governo do Estado de São Paulo, o maior devedor de precatórios do País, com débito de R$ 20 bilhões, busca outros recordes de inadimplência: além de desembolsar em 2012 menos da metade dos recursos para quitação desses débitos em relação aos anos anteriores, também quer aumentar ainda mais a própria dívida, pagando por imóveis desapropriados apenas o valor venal, ficando a diferença para ser paga em precatórios.

Embora a Emenda Constitucional (EC) 62/2009 (a "Emenda do Calote") tenha previsto o prazo de 15 anos para a quitação dos precatórios - o que já é, em si, um prazo absurdo -, o que exigiria do governo estadual um aumento dos repasses relativamente aos anos anteriores (R$ 1,758 e R$ 2,041 bilhões em 2008 e 2009, respectivamente), a Secretaria da Fazenda alocou ainda menos recursos em 2010 e 2011, pondo à disposição do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), respectivamente, R$ 1,387 bilhão e R$ 1,545 bilhão.
Desembolsando menos do que antes da EC 62, e considerando o ingresso de R$ 1 bilhão por ano em precatórios novos previstos pela própria Procuradoria-Geral do Estado (PGE), o Estado paulista, por não conseguir equacionar sua dívida nem em 15 anos, estaria na contingência de ter sequestrado, pelo TJSP, o valor da diferença entre o que é liberado e o montante necessário para o pagamento integral do estoque naquele prazo.

Para tentar se livrar dessa ameaça, que impunha o aumento da alíquota de 1,5% da sua receita corrente líquida para quase 3% - o que ocorreu com inúmeras prefeituras que, a exemplo do governo estadual, não conseguiam equacionar suas dívidas pela alíquota mínima -, o Estado paulista optou pela realização dos leilões no exercício de 2012, mecanismo questionado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 4.357, cujo julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF), embora suspenso em 2011, foi iniciado com o voto do relator, ministro Carlos Ayres Britto, pela inconstitucionalidade da medida.
Entretanto, feita de afogadilho apenas para tentar convencer o TJSP de que, com os descontos que pretende obter, conseguiria pagar a dívida até 2025, a opção pelos leilões não passa de mero artifício para bloquear, nos próprios cofres da Secretaria da Fazenda, quase metade dos recursos previstos para os precatórios em 2012, representando uma economia ao governo de São Paulo de aproximadamente R$ 800 milhões, que não serão repassados ao TJSP simplesmente porque os leilões não têm a menor condição de ser realizados.

Isso porque nem o TJSP nem a PGE têm a menor ideia de quantos credores estão compreendidos nos milhares de precatórios pendentes, muito menos o valor que a Fazenda estadual deve a cada um deles, não havendo também cadastro dos sucessores dos credores originários, informações igualmente imprescindíveis para a realização dos leilões, já que milhares deles faleceram ou cederam seus créditos a terceiros, que, por sua vez, têm igual direito de participar dos leilões. Nem mesmo existe consenso entre a PGE e o TJSP sobre quem seria responsável pela própria realização dos leilões, ou ainda quem deveria licitar e contratar empresa apta à sua realização. Sem falar nas enormes dificuldades na área de informática, já que a base de dados da PGE e do TJSP não é compatível para a transferência de dados, havendo ainda divergências em relação aos critérios de correção dos débitos.

Claro que todas essas dificuldades, oportunamente levantadas pela OAB durante a tramitação da "PEC do Calote" no Congresso Nacional, foram levadas em conta pelos defensores dos leilões de precatórios, tendo o Estado de São Paulo liderado o movimento de pressão para sua promulgação, de vez que não se objetivava mesmo outra coisa senão tornar inviável o próprio cumprimento do regime especial, como vem realmente ocorrendo na prática, em especial quanto aos leilões. Tanto que, por pura falta de condições para sua realização, os demais Estados desistiram dos leilões, optando pela conciliação, com resultados práticos bastante satisfatórios para todos os envolvidos, pois se, por um lado, a entidade devedora obtém algum desconto, por outro, o credor recebe imediatamente seu crédito, sem burocracia ou resistência do devedor, o que também é bom para o Judiciário, que consegue, com rapidez, desincumbir-se dos ônus administrativos que lhe foram impostos pela EC 62.

Mas, como vem ocorrendo há anos, o Estado de São Paulo não quer deixar a liderança no calote dos precatórios, razão pela qual não está interessado senão na instauração do caos, jogando a culpa, que é exclusivamente sua, no Poder Judiciário, que, claro, enfrenta agora, sem nenhuma colaboração da PGE, dificuldades criadas pelo próprio Executivo até mesmo para o levantamento, pelos credores, de importâncias incontroversas já depositadas e que, ainda assim, são frequentemente impugnadas, com intuito puramente protelatório.
Essa hipocrisia se torna ainda mais clara quando, ao instituir um leilão que não tem a menor condição de ser realizado, o procurador-geral do Estado ainda atua no STF postulando que o Executivo seja imitido na posse dos imóveis que quer desapropriar mediante o depósito prévio apenas do valor venal, ficando a diferença para ser paga no futuro, em precatórios, com a geração de outra dívida ainda maior do que a atual.

Portanto, o governo paulista não apenas pretende desembolsar menos recursos do que antes da EC 62 para o pagamento dos precatórios, como atua no STF para ampliar nos próximos anos a maior dívida dessa natureza no Brasil, intenções que revelam o seu interesse em bater ainda outros recordes de inadimplência, criando nos próximos anos uma dívida bem maior do que a atual.

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