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Apresentação do músico Willian Tibério no Sesi de Birigui neste domingo

Cícero Bello, Marcos Rogério e Willian Tibério - Um Asno
Cícero Bello, Marcos Rogério e Willian Tibério
Neste final de semana me permiti realizar atividades que há muito tempo não realizava. Minha mãe, eu e minha filha mais nova decidimos promover uma faxina em nossa dispensa. Isso nos tomou um dia inteiro! Só voltei a ver minha caixa de mensagens e o registro de comentários do blog nesta manhã. O de sempre... Cobranças por que não escrevi nada, ameaças porque escrevi alguma coisa que aborreceu alguém, ofensas por que isso faz alguém se sentir bem e gozações quanto ao emprego simbólico do "asno" para o blog. Isso me provoca ao menos alguma reflexão. Porque as pessoas gostam que sejamos exatamente aquilo que esperam de nós? Por que isso as faz sentirem-se mais importantes! Não se importam se isso nos faz nos sentirmos mais medíocres.

Bom... Nesse final de semana, entre uma reflexão e outra, a leitura de "O ano da morte de Ricardo Reis", de José Saramago e depois de assistir a um excelente filme de Billy Bob Thornton, "Na corda bamba", decidi ir ao auditório do SESI com um dos meus poucos (mas, beeem poucos!), amigos para assistirmos a apresentação do cantor Willian Tibério. Há pouco mais de um ano, comprei o CD de Willian que me foi apresentado por meu amigo. Não costumo debater gostos com ele porque quase sempre ele me convence, portanto, decidi ouvir o trabalho. Não me impressionou no início, mas acabei ouvindo-o repetidas vezes durante os dias. As canções de Tibério me remetiam a minha nostalgia dos anos 80, por isso acabei colocando algumas de suas músicas entre as minhas favoritas. No espetáculo de ontem ele não estava só. Acompanhava-o o professor da escola de música Ornamentos, Cícero Bello, a quem admiro demais, tanto pelas ideias, quanto por sua excelência quando se aventura a reproduzir peças sofisticadas e complexas de nossa MPB. Também estava no palco o professor de bateria Marcos Rogério Reinaldo, cuja performance tocando jazz me fascinou bastante. Adoro Jazz e, quando bem executado... nem se fala!

O projeto de ontem não foi para apresentar as músicas de Willian Tibério. Tocaram apenas duas de suas composições. Ambas estão no seu CD "Palavras de um Livro" e uma está incluída na trilha sonora do filme nacional "Cabeça de Porco". O repertório de ontem foi uma releitura em formato semi acústico dos anos 80, 90 e 2000. Começaram com Lulu Santos e conduziram os instrumentos entre canções de Wando, Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, o inigualável Jessé, Kid Abelha e Titãs (na época que prestavam, ora, não sou obrigado a gostar de Titãs para sempre!). É claro que gosto desse repertório, mas fui mesmo na expectativa de ouvir as canções de Tibério, até como forma de prestigiar um músico de nossa cidade. Não era o caso do projeto de ontem e isso me fez voltar as minhas reflexões.

Cícero já se apresentou no SESI com um projeto instrumental espetacular, o qual não fui assistir por causa dos meus compromissos. Rogério também já mostrou suas virtudes como baterista, como já escrevi, e Tibério também já mostrou seu repertório particular em outras ocasiões. A minha reflexão vai no sentido de que três músicos excelentes tenham de se adaptar aos gostos e apresentar aquilo que está limitado a um contexto cultural de massa. Não me entendam mal!! Acho que se deve produzir e experimentar tudo no que diz respeito a música, mas acho curioso e significativo o fato de termos, em particular em nossa cidade, uma inclinação para ouvirmos apenas o que é música de "massa". Não faz muito tempo arrumei uma baita confusão porque afirmei que acho a música He-man, tocada pela Corporação Musical Maestro Antônio Passarelli, insuportável.

Também acho "Ilariê" da Xuxa (também executada pela orquestra) insuportável, mas me garantiram que o meu comentário é que foi inoportuno porque a população, em sua maioria, aprova. Bem... Grande parte da população aprova o funk "Lek, Lek" e nem por isso o volume de fãs me convence de que esta música também não seja insuportável. Me recordo, inclusive, de que quando o maestro Julio Medaglia vociferava seus comentários contra as músicas que considerava medíocres, uma turba também o atacava por isso. Claro que isso não tem o menor paralelo com relação a minha pessoa. Medaglia é do mercado, ora essa!

Admiro os músicos que, muitas vezes, se submetem ao gosto da massa, até mesmo contrariando suas convicções particulares. Se não for assim, estão fora do mercado. Admiro mais ainda, os que vão na direção contrária e formam seu próprio público, ainda que seja mínimo. Foi assim que me interessei por Belchior, Cordel do Fogo Encantado, Bob Dylan, Bob Geldof, entre outros. Uma vez escrevi que conheço músicos admiráveis nesta cidade e não retrocedo um único caractere que digitei. Me aborreço, sim, é com a cultura local e com a corrente cada vez mais robusta de que música só deve ser tocada se for correspondente ao gosto da massa. Minha experiência me provou que o gosto se constrói com a experimentação, repetição e compreensão. Assim surge o gosto pela leitura, o gosto pela música erudita, ou o gosto pelo que constrói e alimenta o espírito de valor. Uma vez escreveu Olavo de Carvalho que "a língua, a religião e a alta cultura são os únicos componentes de uma nação que podem sobreviver quando ela chega ao término de sua duração histórica".

Carvalho não poderia estar mais correto! Só por causa desses componentes é que conseguimos tomar conhecimento de que algumas civilizações existiram. Acontece que o processo que evidenciamos atualmente nos remete à contramão desse argumento. Estamos emburrecendo de maneira geral e quase global... Me digam qual foi o último momento de riqueza cultural e ou artística em geral de nossa nação. Semana da Arte Moderna de 1922? Tropicália?? O áureo período dos festivais da música? Os Caras Pintadas? Os Black Blocs? Atualmente há "sábios" declarando a obsolescência dos livros, artistas estúpidos sendo celebrados pela massa em transe e agentes excitados que almejam apenas se sentirem mais importantes. Perdemos a densidade cultural e passamos a celebrar a intensidade da ilusão!

Trato a música como trato qualquer assunto em minha vida. Só me impressiono com coisas que não poderia realizar eu mesmo com muito treino e dedicação. Acontece que sei valorizar o esforço daqueles que se propõem a tanto. É o caso dos músicos de nosso município. São pessoas que se dedicam, além do mero prazer, para serem melhores no que fazem. Estudam em conservatórios e pleiteiam um mínimo espaço entre as celebridades do instantâneo. Nem sempre suas vontades vão ao encontro dos gostos da massa e daí se submetem para não ser excluídos. Ora... Eu sei reconhecer essas coisas, ainda que não concorde com elas. Acho que é de responsabilidade geral: autoridades, agentes culturais, população e mídia local, o compromisso com a alta cultura, mesmo que o gosto popular seja contrário. 

Uma vez escrevi sobre a célebre frase atribuída a Alcuíno de Iorque, "Vox populi, vox Dei" (voz do povo, voz de Deus). Esse monge beneditino inglês, fez uso da expressão no ano 780 em uma frase de sua carta a Charlemagne. Porém, repara-se que o contexto era escandalosamente diverso do seu emprego em nosso tempo. A citação completa de Alcuíno é esta: Nec audiendi qui solent dicere, Vox populi, vox Dei, quum tumultuositas vulgi semper insaniae proxima sit, em cuja tradução para o português temos: "E essas pessoas não devem ser ouvidas por quem continua dizendo que a voz do povo é a voz de Deus, desde que a devassidão da multidão sempre está muito próxima da loucura". Ou seja, a expressão não é nova e nem, tampouco, remete-se ao significado que muitos charlatães a tanto recorrem. É insano afirmar que a vontade da massa tem relevância, já que não passa de uma multidão de pessoas fascináveis e excitáveis por qualquer coisa que os faça se sentirem integrados a um grupo e que isso lhes empresta certa importância. Não vou nem gastar o meu tempo com exemplos de barbárie causados pela vontade do povo, basta que reflitam um pouco. Para os cristãos, basta lembrarem-se de Barrabás e ponto!

É um contrassenso que uma apresentação voltada para a massa conte apenas com um auditório reservado para 204 expectadores e muitas vezes não chega a preencher a metade. Mas, isso é porque prendem-se a qualidade dos espetáculos, mas se esquecem de que também a publicidade e o marketing dos eventos devem ser massificados. Continuo torcendo por nossos músicos e agentes culturais em geral, mas sonho com o dia em que eles se unam para provocar em minha cidade uma verdadeira revolução no que diz respeito a alta cultura. Não vai demorar para que alguns confundam o que escrevi e me ataquem com força. Bolas! Não pretendo extinguir a música de massa. Esse tipo de música também é responsável pela construção de riquezas. O que, estupidamente pleiteio, e não devo ser o único, é que as frações do espaço para a cultura sejam mais harmonicamente divididas.

Não vou me alongar muito porque sei que se algumas pessoas pararam para ler esse texto, muitas já devem ter desistido da leitura antes de chegar a metade. Parabéns aos músicos Cícero, Willian e Rogério, pela apresentação de ontem e pela oportunidade conquistada em virtude de seus méritos. Espero ter muitas oportunidades de assistir a outras apresentações e que mais de nossa população possa conhecer e valorizar suas qualidades.

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