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Eram Quatro Irmãos... O que é um Vida Loka, Mathias! - LUTO

Luto - Um Asno
Já escrevi várias vezes aqui que eu não divulgo notícias, eu opino! E, não raro, minhas opiniões também podem me ferir... Ontem, enquanto conversava com uma conhecida que mora na Vila Bandeirante, em Birigui, fiquei sabendo da morte de um jovem com dezessete anos incompletos que teria sido assassinado com dois tiros na cabeça, um no abdome e um no pescoço. A moradora me perguntou se eu publicaria algo a respeito. Não sou hipócrita... Minha resposta automática foi: "Não vou desperdiçar meu tempo com isso! É menos um nóia pra dar trabalho!". Minha opinião quanto a redução da maiordade penal não mudou. Aliás, ganhou mais força com esse episódio! A prisão de menores que cometem crimes, senão como solução para a escalada da criminalidade, serviria, ao menos para inibir o ingresso tão cedo no delito, pois ja não haveria mais o recurso da inimputabilidade. A perda da liberdade poderia, também, servir como proteção a nossas crianças. Proteção delas mesmas.
Hoje, enquanto tomava o rumo da estrada, recebi uma ligação que fez com qe eu freasse qualquer ímpeto de julgamento preconceituoso que eu poudesse ter com relação ao que nos acostumamos a chamar de "Vida Loka". Meu amigo Jorge foi o portador da notícia que me arremessou ao solo e me igualou as vítimas. O garoto assassinado... aquele "nóia"... eu o vi ser amamentado. Eu assisti o seu progresso pueril, vi seus primeiros passos, suas primeiras travessuras. Passei uma tarde, junto ao pai, procurando-o quando deu "um perdido" nos pais para se entreter com os amigos. Vi, com o tempo, a ternura com os três irmãos menores e a sensibilidade se desenvolver somados a um talento próprio de adolescente que tem muito o que aprender e viver. Era um menino sensível demais para o nosso tempo. Os jornais e o rádio não publicaram seu nome porque a legislação preserva os menores nesses casos. Mas ele não o tinha para ser esquecido.
Há dois anos, ele me procurou para desabafar sobre como as coisas o deixavam confuso, sobre suas ambições particulares e sonhos comuns que todos já tivemos. O submundo já o fascinava. Era mais estimulante do que a proposta da escola mal estruturada e do que o discurso que os professores mal preparados tinham a lhe oferecer. A labuta incessante dos pais era insatisfatória para os patamares que almejava. Não fui eficiente e sedutor o suficiente para sugerir-lhe uma visão mais acolhedora. "O que é um Vida Loka, Mathias?", eu lhe indaguei. "É um cara que não espera que lhe dêem o que já lhe pertence... ele toma se for preciso!", ele me respondeu. Era um menino para saber o que a vida lhe reservava, mas já era um homem para dizer a si mesmo: "Basta! Chega de muito discurso, é hora de fazer algo!". Acontece que o caminho escolhido exige que o ingressante, além de ser Vida Loka, também deve se parecer com um Vida Loka. Para se enturmar é preciso deixar a inocência e vestir o costume dos Bad Boys dos filmes violentos que assistimos.
O ritual de iniciação exige que se realizem feitos específicos que possam ser significativos e apreciados pela tribo dissidente. Tem que ser do mal! Não são mais folguedos, são infrações! Não são mais travessuras, é uma provocação direta ao status quo da sociedade! Uma "ferramenta" traz um sentimento de poder. "Um "ferro" na mão traz mais adrenalina do que uma caneta! Um visual descolado projeta mais respeito do que o mero porte de um livro. Abandona-se a infância e abrevia-se a puberdade! Reconhece-se como a um homem feito e, encurtando a vida, deixa para traz outra criança com seu legado ainda no ventre. Foram necessários dois homens feitos (ao menos um tem mais de trinta anos), para, com todo o exagero da violência, lhe demonstrar com um ato apenas, quão sinistra é a realidade que escolheu.
Não adianta buscar culpados. Não é o governo, não é a mídia traiçoeira, não é a ausência de um modelo específico de humanidade. São todas as coisas combinadas e a um só tempo. Aos três irmãos que ficaram, não haverá mais a proteção fraterno-paternal que ele lhes oferecia. Aos pais, ficarão as eternas imagens dos risinhos infantes, dos passos desastrados da primeira caminhada, do pânico descomunal quando não sabiam onde e porque doía, das noites em claro embalando-o até o sono sadio. Em mim, ficará gravado aquele olhar distante e único de um jovem que nunca saberá o que a vida poderia representar para ele se uma outra escolha o tivesse encantado mais do que a vida louca. Falhei com você, Mathias. Também segurei a arma que o derrubou. Essa arma é a indierença com a qual tratamos as crianças que, simplesmente, querem nossa atenção.

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