NÓS E OS OUTROS (Publicado na edição de VEJA desta semana)
“Só no Brasil” — eis aí três palavras que todo brasileiro costuma
ouvir, 365 dias por ano, a respeito de coisas que só acontecem por aqui,
geralmente muito ruins, e que são desconhecidas no resto do mundo.
Em geral começam como uma discreta trapaça no uso do dinheiro
público, depois se transformam num hábito nacional e, no fim, acabam
virando um maciço conto do vigário aplicado o tempo todo pelos governos —
que, como viciados em drogas, não conseguem mais viver sem ele. É o que
acontece, entre tantos outros pecados exóticos, com a “publicidade
oficial”.
Qualquer cidadão sabe muito bem do que se trata — são esses anúncios
que governantes de todos os níveis, da alta administração federal a
remotas prefeituras do interior, pagam (com dinheiro do orçamento, é
claro) para publicar em jornais e revistas, no rádio e na televisão.
Dizem, ali, quanto são bondosos, eficazes e trabalhadores — e mostram as
obras de seus governos, reais ou imaginárias, como se estivessem
fazendo um imenso favor à população que pagou por elas.
Publicidade que trata o contribuinte como um bobo alegre
(...)
Neste assunto, todos fazem, e ninguém critica ninguém: delitos coletivos nunca recebem condenação
Não há inocente aqui; todos os políticos, sem nenhuma exceção, fazem o mesmo quando estão no governo.
Nesse assunto, ninguém critica ninguém, no conforto geral de saber
que delitos coletivos nunca são realmente condenados. É assim que
permanece viva, cada vez mais, a publicidade oficial — uma aberração só
vista no Brasil.
Dá para imaginar o governo da Itália, por exemplo, gastando fortunas na mídia para dizer “Itália — um país para todos”? Ou algo assim: “Prefeitura de Londres — antes não tinha, agora tem”? Não dá.
O funcionário que sugerisse uma coisa dessas seria provavelmente encaminhado a uma instituição psiquiátrica.
Neste momento, com a campanha eleitoral, a coisa pega fogo. No ano
passado, só o governo federal gastou mais de 3 bilhões de reais em
“comunicação”, entre publicidade e patrocínios. Juntando a isso estados e
prefeituras, o volume de gastos entra em mares nunca dantes navegados.
Os políticos alegam que é pouco, diante do total de quase 90 bilhões
aplicados no mercado publicitário brasileiro em 2011. Pode ser, mas o
dinheiro não é deles — é do cidadão, e está sendo jogado no lixo para
pagar os elogios que fazem a si próprios.
A imprensa de verdade vive do apoio de seu público e dos
anúncios privados que ele atrai, e não de verbas publicitárias do
governo
É uma piada. Não informam coisa nenhuma, e, na hora de prestar contas
de verdade, fazem justamente o contrário: desligam a chave geral para
deixar tudo o mais escuro possível.
Os órgãos de comunicação, sem dúvida, se beneficiam da publicidade
oficial; nenhum deles é uma santa casa de misericórdia, e todos têm de
pagar suas despesas. Mas a imprensa de verdade vive do apoio do seu
público e dos anúncios privados que ele atrai, e não de verbas
publicitárias do governo. Seu único mandamento, nessa história toda, é
manter a própria independência. E os que não mantiverem? Problema deles.
Veículos que, em troca de anúncios, só publicam o que interessa ao
governo, e escondem tudo o que não interessa, têm de resolver isso com
os seus leitores, ouvintes e espectadores; se eles desconfiarem que
estão sendo enganados, podem ir embora. O certo, no fim de todas as
contas, é que o governo não deveria pagar um único tostão para a mídia
publicar sua propaganda.
Eis aí mais uma coisa que nos separa, por exemplo, de um país como a
Alemanha, onde publicidade oficial não existe. É que a Alemanha,
coitada, é apenas a Alemanha. Já o Brasil é o Brasil — aqui há dinheiro de sobra para o governo
jogar pela janela. Somos um país onde a população é
riquíssima.
Bem dito meu caro, quantos e quantos bilhões não são investidos nestas propagandas, dinheiro publico que sai do bolso da população inclusive do meu, políticos sempre acham que estão fazendo favores, não fazem mais que a obrigação, está ali para isso e ganha para isso, ganham muito bem, diga-se de passagem, e faz pouco pelo que ganham. Nosso país era para estar bem mais evoluído se fosse bem administrado.
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