2012: O ano do apocalipse político no Brasil
Quem acha que o STJ nunca teve tanto destaque quanto nos últimos episódios envolvendo o escândalo Lula X Gilmar Mendes, se enganou. Se engana também quem acredita que o Supremo nunca teve trapalhadas que acabaram absolvendo criminosos como foi o caso de uma ação contra os deputados federais Alceni Guerra e Fernando Giacobo, denunciados por fraude em licitação e beneficiados pela lambança do supremo e a prescrição do crime.
Do repórter Luiz Maklouf Carvalho, Publicado na revista Piauí em agosto de 2010:
Data Venia, o Supremo(...)
O caso em pauta era uma ação contra os deputados federais Alceni
Guerra e Fernando Giacobo, denunciados por fraude em licitação.
Tramitava no Supremo Tribunal Federal desde 2007 e prescreveria
exatamente no dia seguinte. Ellen Gracie, relatora, votou pela
condenação dos dois políticos*.
Com o ministro Eros Grau em viagem, dez ministros estavam presentes.
Quatro votaram com a relatora, condenando os políticos: Cezar Peluso,
Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Cármen Lúcia. Quatro os absolveram: Dias
Toffoli, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e Celso de Mello. E um,
Ricardo Lewandowski, desafiou o senso comum: inocentou Alceni Guerra,
ministro da Saúde do governo Collor, mas condenou o outro acusado.
Ficaram, então, 5 a 5 para Alceni Guerra, o que o absolveria, porque o
empate favorece o réu. E 6 a 4 contra Fernando Giacobo, o que o
condenaria. A subprocuradora-geral da República, Deborah Duprat, resumiu bem a
confusão: “Neste caso, teremos o réu principal absolvido; e o
secundário, condenado.” A cizânia se estabeleceu. “Condenar um e absolver o outro fica muito
difícil”, disse o ministro Marco Aurélio, olhando fixo para Lewandowski.
Cezar Peluso também o encarou: “Reconsidere seu voto e absolva os
dois.” Lewandowski encabulou-se e disse, titubeante: “Tenho dificuldade
de absolver o outro.” Marco Aurélio riu com sarcasmo. Peluso insistiu
para o colega mudar o voto. Ellen lembrou que a prescrição ocorreria no
dia seguinte.
Quando o presidente Gilmar Mendes ia proclamar o resultado, o
advogado do condenado apelou pelo bom-senso: que os dois acusados fossem
absolvidos. O ministro Ayres Britto, num mau momento, sugeriu a
suspensão do prazo de prescrição, como se fosse possível. “Mas aí vamos
legislar”, protestou Marco Aurélio.
Diante do bafafá e da pressão, um constrangido Lewandowski disse: “Eu
reajusto o meu voto e absolvo ambos os réus.” Marco Aurélio riu de
novo. Ayres Britto podia ter deixado por menos, mas não deixou: “Vossa
Excelência mudou o voto, não é?”, indagou, como se não tivesse notado.
Lewandowski respondeu: “A situação é absolutamente atípica.”
A veia poética de Ayres Britto, sempre presente, lembrou-lhe versos
de José Régio, que recitou sem pejo: “Não sei por onde vou. Só sei que
não vou por aí.”
Resolveram suspender a decisão, apesar da prescrição no dia seguinte,
para esperar o voto do ministro Eros Grau. Ele o proferiu uma semana
depois, e votou pela absolvição dos réus – que na prática estavam
beneficiados pela prescrição.
Órgão máximo do Judiciário e sustentáculo da República, o Supremo
Tribunal Federal é uma instituição que toma decisões de afogadilho, sem
muita lógica – como a mudança de voto de Lewandowski. Mas sempre as
recobre de pompa, de um linguajar precioso que faz sobressaírem as
observações maldosas. Picuinhas se imiscuem em discussões importantes.
Assessores fazem o serviço de magistrados. Há ministros que foram
condenados em instâncias inferiores. Um, cujo pedido de impeachment só
não foi encaminhado ao Senado porque o corporativismo prevaleceu. Outro,
que chamou o colega de chefe de capangas. Até a eleição do seu
presidente se dá em terreno incerto.
(...)"A grande figura do Supremo Tribunal Federal em seus primeiros anos não
foi nenhum ministro, e sim o advogado Rui Barbosa.
(...)
O STF foi, primeiro, Supremo Tribunal de Justiça – sucessor de uma
Casa da Suplicação do Brasil, instalada por dom João VI, em 1808, quando
a corte portuguesa fugiu das tropas napoleônicas para o Rio. Criado
pela Constituição de 1824, foi efetivado cinco anos depois, em 1829,
composto por dezessete juízes. Passou a ter o nome que tem – Supremo
Tribunal Federal – no começo da República, primeiro por decreto, e,
depois, pela Constituição de 1891. Sua primeira sede foi o prédio do
Senado da Câmara do Rio, na atual Praça da República. Depois funcionou
na rua 1º de março. Eram quinze juízes, a maioria oriunda do Império.
Floriano Peixoto foi o primeiro presidente a violentar o Supremo –
sem maior reação. Impôs ministros e deixou de indicá-los a seu
bel-prazer. Lá meteu dois generais e um médico. Este, Barata Ribeiro, dá
nome a uma das ruas mais conhecidas de Copacabana. Foi ministro por
quase um ano sem que o Senado aprovasse a sua indicação, e saiu quando o
Senado o rejeitou. Essa e quatro outras, no mesmo governo Floriano,
foram as únicas rejeições de ministros pelo Senado em toda a história do
STF.
Getúlio Vargas também pisou no Supremo Tribunal Federal – inclusive
com a aposentadoria compulsória de meia dúzia de ministros, e com a
proibição de apreciação dos atos do Governo Provisório instalado em
1930. Com o golpe de 1937 e a ditadura do Estado Novo, um decreto
outorgou a Getúlio o poder de nomear o presidente e o vice-presidente da
corte.
Enquanto funcionou no Rio, os juízes do Supremo não tinham maiores
regalias. Carro, era só para o presidente. Quando ele era Orozimbo
Nonato, ficava na garagem se viesse a quebrar. No começo dos anos 60,
Márcio Thomaz Bastos, um advogado em começo de carreira, o viu tomar um
bonde, carregado de processos. Certa vez, Orozimbo Nonato ficou
escandalizado num verão lancinante, quando o ministro Luiz Gallotti
pediu-lhe que providenciasse dois aparelhos de ar-condicionado. “Até
esse momento, Gallotti, você seria o meu candidato ideal a presidente da
República”, disse-lhe Nonato. “Jamais pensei que pudesse revelar-se
tamanho perdulário com o emprego do dinheiro público.” Os gabinetes dos
ministros tinham 20 metros quadrados (quanta honra tinha esse senhor...).
O Supremo também baixou a cabeça no golpe militar de 1964. Seu
presidente, Álvaro Moutinho da Costa, filho de general e irmão de
coronéis, foi à posse de Ranieri Mazzilli na noite de 1º de abril,
quando João Goulart ainda estava no Brasil
Minha Vez...
Sem a menor maldade, mas essa turma deixa a gente inseguro... Com o caráter duvidoso de grande parte de nossos políticos, com a asquerosa perfídia com que as diversas mídias do Brasil tratam a sociedade, com o desinteresse da população para com os assuntos relevantes da política, com o avanço messiânico de certos eternos candidatos e a reforma política congelada no congresso, pinta-se no horizonte deste ano apocalíptico o famoso rodízio de pissa que já se percebe seus primeiros odores.
Nenhum comentário:
1 - Qualquer pessoa pode comentar no Blog “Um Asno”, desde que identifique-se com nome e e-mail.
a) Em hipótese alguma serão aceitos comentários anônimos.
b) Não me oponho quanto à reprodução do conteúdo, mas, por uma questão de responsabilidade quanto ao que escrevo, faço questão que a fonte seja citada.
2— Não serão aceitos no Blog “Um Asno” os comentários que:
1. Configurem qualquer tipo de crime de acordo com as leis do país;
2. Forem escritos em caixa alta (letras maiúsculas);
3. Estejam repetidos na mesma ou em notas diferentes;
4. Contenham insultos, agressões, ofensas e baixarias;
5. Reproduzam na íntegra notícias divulgadas em outros meios de comunicação;
6. Contenham links de qualquer espécie fora do contexto do artigo comentado;
7. Contenham qualquer tipo de material publicitário ou de merchandising, pessoal ou em benefício de terceiros.